
Sabiam que o estilo de condução alimentar realizada pelo principal cuidador sobre a
criança é de extrema importância na abordagem e tratamento das dificuldades
alimentares?
Sim, as ações dos pais alteram o comportamento alimentar da criança. Os estilos são influenciados não só pelas preocupações dos pais e padrões culturais, mas também pelas características das crianças.
Ao mesmo tempo em que as práticas alimentares parentais se constituem nos
comportamentos adotados pelos pais na intenção de influenciar o consumo e
hábitos alimentares da criança, os estilos parentais refletem o clima emocional
durante as refeições.
Dentre as práticas alimentares, refere-se como “controle coercivo” a atitude que se demonstra em tentativas de domínio, pressão ou imposição da vontade dos pais sobre as crianças, com repercussões negativas nos hábitos alimentares.
Esse controle pode ser exercido sob diversas formas como punição física, ameaças,
manipulação dos sentimentos, pensamentos e costumes, o que leva a sensações de culpa, carência e ansiedade pelas crianças.
As práticas coercivas de restringir, pressionar, subornar, ameaçar e usar a comida para controlar emoções negativas geram um ambiente estressante, com repercussão oposta ao desejável, pois podem levar à recusa de alimentos específicos ou da rejeição completa da refeição, cujo resultado é contrário ao desejado no cenário da alimentação.
Além do reflexo sobre os hábitos alimentares, essas práticas podem comprometer o ganho de peso da criança.
São bem estabelecidos quatro padrões e estilos alimentares parentais de acordo
com as práticas acima referidas, a saber: responsivo (autoritativo), controlador
(autoritário), indulgente (permissivo) e negligente (não envolvido ou passivo).
O estilo responsivo teria o efeito positivo na alimentação, o que não aconteceria
com os outros, que trazem consequências negativas.
Dentre os não responsivos, estima-se que o estilo controlador seja o mais reproduzido, pois abrange em torno da metade dos casos. Ao mesmo tempo, pode acontecer dos pais comportarem características de mais de um perfil.
Os cuidadores ou pais responsivos são envolvidos e orientam de forma positiva
a alimentação da criança, em vez de controlá-la, estabelecendo hábitos saudáveis e os limites necessários para o comportamento adequado da criança frente ao ato de se alimentar. Em geral, falam positivamente sobre a comida, dividem as responsabilidades com a criança, comem saudável e como modelo, incentivam a alimentação saudável pelo diálogo e elogios sem excessos, reconhecem os sinais de fome e saciedade da criança, estabelecem horários regulares e duração apropriada das refeições para induzir o apetite, sem recorrer a técnicas coercitivas
desagradáveis.
Como resultado desse comportamento, as crianças que convivem com alimentadores responsivos costumam comer mais frutas, legumes e derivados de leite, menos junk food e apresentam menor risco de excesso de peso.
Os cuidadores ou pais de estilo controlador tentam controlar a alimentação da criança, restringindo alimentos ou pressionando-a a comer e ignoram os sinais de fome, as necessidades e o comportamento da criança. Por vezes, subornam para comer com recompensas, usam da força, punição, imposições, obrigações, castigos ou compensações inadequadas para coagi-las a comer. A princípio, esta prática pode até ter resultados, porém torna-se ineficaz com o decorrer do tempo, pois a pressão para comer fará com que a criança recuse ainda mais a refeição, o que determina, por sua vez, mais pressão do cuidador, fechando o ciclo vicioso
“pressão para comer – recusa – mais pressão – mais recusa”.
Essas crianças podem apresentar ajustes inadequados de calorias, menor ingestão de frutas e legumes, maior chance de estar acima ou abaixo do peso adequado.
Aqueles de estilo indulgente ou permissivo não estabelecem limites, respondem de forma exagerada às necessidades da criança, cedendo às pressões e alimentam com o quê, onde e quando ela quer. Muitas vezes, preparam comidas especiais ou múltiplos alimentos ou inúmeras opções de preparações com a finalidade de atender a todas as necessidades da criança, ignorando inclusive os sinais de fome. Esse comportamento implica em maior chance da criança estar acima do peso, consumir menos alimentos nutritivos, pois come dietas pobres na maioria
dos nutrientes, exceto gorduras e açúcares.
O estilo negligente ou passivo ou não envolvido se caracteriza por desistir de
suas responsabilidades alimentares, até mesmo por deixar de oferecer comida à
criança. Ignora os sinais de fome da criança ou as necessidades físicas e psicológicas, assim como não estabelece limites. Ao alimentar a criança, o cuidador pode evitar o contato visual e parecer distante. As crianças mais velhas são muitas vezes não bem cuidadas, o que pode gerar problemas emocionais, deficiências de desenvolvimento e crescimento, depressão ou outras condições que dificultam ainda mais a alimentação. As crianças com cuidadores com este estilo podem estar acima do peso, em virtude de não se preoucuparem com a alimentação,
se alimentarem praticamente sozinhos ou por terceiros, com preferência para comidas não saudáveis.
Resumo dos estilos parentais e as prática alimentares:
Responsivo
– Orienta a alimentação da criança
– Estabelece limites
– Comem como modelo e conversam sobre comida de forma positiva
– Respondem aos sinais de fome da criança
Controlador
– Tentam controlar a alimentação da criança
– Restringem alimentos da criança
– Pressionam a criança para comer
– Suborna a criança com recompensas
– Ignora os sinais de fome da criança
Permissivo
ou Indulgente
– Não estabelece limites
– Alimenta a criança com o quê, onde e quando ela quer
– Prepara comidas especiais para a criança
– Ignora os sinais de fome da criança
Não Envolvido
ou Passivo
– Desiste das responsabilidades alimentares
– Não estabelece limites
– Ignora os sinais de fome ou as necessidades
físicas e psicológicas da criança
Em resumo, os pais com práticas alimentares responsivas ensinam o filho a ter melhor compreensão de fome e saciedade, que alimentos são bons e comer é prazeroso, a ter experiências com novos alimentos sem stress e estabelecer padrões de refeições culturais e familiares. Por outro lado, os pais controlado-
res ensinam ao filho a comer quando nao está com fome, a comer para agradar outras pessoas ou para obter algo, que comer não é prazeroso, a não gostar de alimentos saudáveis e a gostar de alimentos não saudáveis.
É importante que o profissional de saúde que lida com crianças com dificuldade alimentar saiba reconhecer os estilos parentais para melhor orientar os pais acerca de suas posturas e de que forma o ambiente e comportamento pessoal, familiar e doméstico podem ser modificados e se aproximarem gradativamente do mais adequado.
Contem comigo para isso! 🥰
Fonte: Guia de Orientações - Dificuldades alimentares – Departamento Científico de Nutrologia - Sociedade Brasileira de Pediatria - 2022
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